CARACTERÍSTICAS E MODELOS TÁTICOS – II

Blog Tricolor

Eu sustentei, anteriormente, que não gosto de esquemas baseados na linha 3 de zagueiros porque:

 

a.) entendo que a linha de 4 é uma base melhor para a ocorrência de variações táticas sem mexidas com a bola rolando; e,
b.) acho que é um esquema mais facilmente burlável que modelos montados a partir de uma linha de 4 defensores.

 

Um dos modos mais fáceis de travar um time que jogue com uma linha de 3 zagueiros em sua retaguarda é espelhar o modelo, o que faz com que o jogo fique travado e decidido em duelos individuais, o que, costumeiramente, costuma favorecer o melhor time tecnicamente.

 

Esse é o principal motivo pelo qual Abel Ferreira, do Palmeiras, enfrentava o São Paulo do Crespo sempre com a linha de 3 zagueiros e porque Crespo abandonou o sistema de jogo para enfrentar o Palmeiras em um momento posterior da temporada passada.

 

Uma segunda forma clássica de enfrentar equipes baseadas na linha de três zagueiros, além de algumas outras mais sofisticadas, é armar a equipe com três atacantes e liberar um dos laterais para avançar impunemente.

 

O lateral que fica precisa funcionar quase como um zagueiro para evitar que a defesa perca do homem da sobra, enquanto, o lateral que avança precisa se apresentar para equilibrar numericamente o jogo no meio de campo, o que, em geral, exige que um ou dois membros do meio de campo tenham mobilidade suficiente para compensar o homem a menos com movimentação. Quando tudo isso funciona, você retira o homem da sobra da linha de 3 adversária, o que, em regra, quer dizer problemas para os três zagueiros.

 

Motivos pessoais a parte, é evidente que os sistemas baseados em linha de 3 possuem méritos, ou, então, não seria um modelo de jogo amplamente utilizado em território europeu, no qual, o futebol está em outro patamar no que condiz com tática e modelos táticos diversificados e, isso posto, é inegável que um São Paulo armado com uma linha de 3 zagueiros possa ser um bom time.

 

“É lógico, afinal, todo mundo diz que esse elenco tem características para jogar com três zagueiros”. Sim, muita gente afirma que esse é um elenco em que as características dos jogadores torna a adoção do 3-5-2 ou 3-4-3 uma escolha óbvia, mas, isso é mesmo verdade?

 

Uma base tática de 3-5-2 exige que o elenco construído possua jogadores de lado (alas ou pontas) capaz de oferecer profundidade ao time e, obviamente, exige que você tenha bons zagueiros em uma boa quantidade.

 

Com um homem a menos no meio de campo, são necessárias algumas escolhas, mas, idealmente, ao menos no futebol moderno, você precisa de 3 segundos volantes que consigam destruir, construir e armar com certa naturalidade e, de preferência, com características diferentes entre eles. Um que tenha o passe em profundidade, um que se infiltre para finalizar e um que seja capaz de distribuir o jogo.

 

Caso você opte por jogar com um meia mais clássico atrás de sua dupla de atacantes, ou opte por jogar com um volante mais fixo a frente da própria zaga, os outros 2 jogadores do meio vão ter que compensar fisicamente para preencher o espaço e dar opções de passe para abrir espaços através da movimentação incessante.

 

Com um homem a menos no meio de campo, igualmente, é esperado que seus zagueiros fiquem muito mais com a bola no pé, (não precisa acreditar em mim, pode verificar a entrevista do Volante Souza ao Charla Podcast em que ele fala sobre não gostar de jogar com linha de 3 zagueiros), então, é aconselhável que seus zagueiros tenham o passe e alguma capacidade de construção de jogo ou de desafogar o time.

 

Bons zagueiros. Zagueiros técnicos. Alas ofensivos capazes de explorar a linha de fundo. Homens de meio versáteis. O Elenco atual do São Paulo, de fato, possui tudo isso, então, quem sustenta que esse é o modelo tático ideal para o São Paulo jogar com esse elenco está coberto de razão, certo?

 

Eu diria que não. Uma coisa é as características do elenco favorecem um certo modelo de jogo para que ele possa ser usado em algumas partidas em que seja mais vantajoso jogar com três zagueiros, outra coisa é definir um modelo tático para ser a base de jogo para a temporada inteira, uma vez que, todos seus jogadores não serão capazes de jogar, com performance razoável, todos os jogos da temporada.

 

O São Paulo possui bons zagueiros. O São Paulo possui zagueiros que saibam construir, porém, apenas dois deles sabem construir com qualidade de passe realmente bem: Diego Costa e Léo. Ferraresi, que chegou agora, aparentemente também faz isso bem, porém, Arboleda e Miranda, embora ótimos zagueiros, não são ótimos com a bola no pé.

 

Some ao fato de que apenas cinco zagueiros para adotar esse modelo de jogo pela temporada inteira (e tivemos apenas quatro na maior parte dela e apenas três por 1 mês, se considerarmos apenas jogadores que não são apostas) parece-me um número muito diminuto de zagueiros para que possamos dizer que esse é o esquema ideal para ser utilizado como base. Junte ao fato de que Miranda, aparentemente, não consegue mais suportar jogar mais que duas partidas em um sequência de jogo sem que o físico comprometa sua atuação.

 

Meias versáteis e intensos temos, de fato, Galoppo, Igor Gomes e Rodrigo Nestor. Thales Costa está pronto para ganhar minutos como opção de segundo tempo, mas, não vejo mais que isso nele nesse momento. Colorado não sabemos, mas, o que tivemos de amostra parece deixar claro que a pouca utilização deve-se à pouca intensidade. Pablo Maia e Luan têm mais característica de primeiro volante que guarda a zaga, do que o tipo de volante que preenche o meio de campo e auxilia na construção. Esse é o motivo pelo qual Gabriel Neves, no Nacional, era segundo volante e aqui é utilizado como primeiro volante.

 

André Anderson? Talvez não tenhamos visto o bastante dele, como com Colorado, mas, me parece que é um meia que não marca o suficiente para ser utilizado em uma das 3 posições de meio nesse modelo tático.

 

Nas alas, Reinaldo não tem mais o vigor para chegar no fundo toda hora, mas ainda faz isso com frequência o bastante e tem refino técnico suficiente para ser uma espécie de meia-aberto que, em dias bons, compensa isso. Wellington e Igor Vinicius tem ótimas características para serem alas, porém, Rafinha não pode jogar de ala. Não tem profundidade e, a ausência de pontas (considerando a má-fase do Marcos Guilherme) impede que isso seja compensado.

 

Obviamente, um dos meias pode ter a função de cair sempre pela direita para dar profundidade ao setor quando Rafinha joga por ali para dar profundidade ao time, o que, aliás, esse meia já seria obrigado a fazer para apoiar o Igor Vinicius de qualquer forma. Igor Gomes costuma fazer isso, embora, não possua velocidade e o 1×1 necessário.

 

Allison poderia fazer isso? Sim. Não com a mesma velocidade, não com o 1×1 esperado, mas, poderia funcionar se fosse escalado como segundo atacante. As ressalvas à utilização de Allison como membro de um tripé de meio campo no 4-3-3 são as mesmas aqui, afinal, faltaria a qualidade de passe e o poder de marcação nesse meio de campo com ele escalado, mas, Allison como segundo atacante significa perder a criatividade e o poder de finalização do Luciano.

 

Rogério Ceni é atacado, com frequência, por parte da torcida pela insistência com Igor Gomes e Rodrigo Nestor no meio-de-campo, porém, é mesmo teimosia? Quase todas as opções de montagem do meio de campo sem a presença de ambos e com um esquema de três zagueiros me parece provar que o técnico não é burro ou teimoso. Apenas entende o necessário para que o esquema seja funcional.

 

“Galoppo poderia ser utilizado! ”. Sim. No lugar de um deles, não de ambos. E, nesse sistema, a marcação precisa estar extremamente encaixada e, mesmo da televisão, é evidente que Galoppo, embora pareça bom jogador, ainda não tem esse encaixe e chega atrasado na marcação.

 

Queremos três zagueiros? Nestor e Gomes são essenciais ao esquema nesse momento e, talvez, só deixem de ser quando Thales Costa estiver pronto, Galoppo totalmente adaptado e André Anderson se prove capaz de fazer o mesmo trabalho que Igor Gomes, ou, então, esse time se tornará vulnerável mesmo com três bons zagueiros em campo.

 

É coincidência que o pior momento físico do Igor Gomes na temporada seja exatamente o mesmo momento que o São Paulo se torne mais vulnerável na defesa?

 

Torcedores que odeiam o jogador e acham ele o único motivo por tudo que acontece de ruim no São Paulo, provavelmente, vão dizer que é besteira, mas, na minha visão tática a sobrecarga física do jogador que joga para equilibrar o time é justamente o motivo para a fragilidade tática do São Paulo.

 

Então, sim, o atual elenco do São Paulo possui características para ter o 3-5-2, não o 3-4-3, como modelo tático, mas, para fazer isso, temos um elenco curto que, a longo prazo na temporada, tornará o modelo tático inviável conforme as peças foram perdendo condições física de performar em 100% e em razão da ausência de características parecidas no banco de reservas.

 

Dessa forma, o modelo com 3 zagueiros deveria ser guardado para alguns jogos da temporada em que fosse detectada uma maior possibilidade de vantagem tática a partir desse modelo e não como base do modelo tático para a temporada.

 

Victor Gabriel Augusto

Twitter: @victor_gaugusto

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